Bom, já faz uma semana que voltei de Luanda. Está na hora de escrever um pouco sobre o que vivi lá né. Slow-blogging também tem limite, rs. É assim, pra quem não sabe, faz um ano que eu trabalho com arte contemporânea africana, mais precisamente com a Fundação Sindika Dokolo, situada em Luanda, Angola. Eu coordeno alguns projetos e o escritório da Fundação aqui em São Paulo. A FSD é baseada numa coleção africana de arte contemporânea e é idealizadora e produtora da Trienal de Luanda entre outros eventos de cultura contemporânea na África e no mundo.
Passei um mês em Luanda na sede da Fundação para trabalhar nos projetos da II Trienal de Luanda 2010. Cheguei lá no dia 26 de maio de manhã bem cedo, às 4 horas da manhã.
Já naquela tarde, depois de dar uma descansada, fui ao escritório novo da FSD. Estava programado para acontecer a conferência de imprensa anunciando a II Trienal de Luanda 2010 (daqui pra frente, chamada de II TL). Que ótimo, junto com os jornalistas, eu também vou poder me inteirar melhor, já no primeiro dia.
Depois desse evento, o próximo significativo foi, depois de uns dias, a visita do pessoal da Trienal de Arquitetura de Lisboa. José Mateus e Delfim Sardo chegaram antes e um dia depois, o João Luis Carrilho da Graça. José Mateus é arquiteto e diretor da Trienal de Arquitetura de Lisboa. Foi ele o idealizador e conceptor do evento.
Ele dirige o seu ateliê de arquitetura ARX junto com o irmão, Nuno Mateus. Além da sua prática como arquiteto no ateliê com vários prêmios conquistados, leciona, profere palestras em diversos países, é coordenador e autor de uma revista de arquitetura e integra diversos júris de prêmios de arquitetura no mundo, inclusive na Bienal de Arquitetura de São Paulo de 2003.
Dono de uma fala calma e clara, é um apaixonado pelos filhos, pela filha caçula (a Trienal), pelo trabalho e pela gastronomia, em especial a japonesa. A cada refeição em que dividíamos a mesa, ele me falava de uma receita que gostava de fazer.
Delfim Sardo é o curador da próxima Trienal de Arquitetura de Lisboa, também em 2010 como a Trienal de Luanda. Inclusive, as duas trienais nasceram no mesmo ano, 2007 e as duas são TL, só confirmando as conexões intrínsecas entre elas. Sardo estudou filosofia na Universidade de Coimbra e se dedica à curadoria e aos ensaios sobre arte contemporânea.
Também muito calmo mas estampando um gentil sorriso no rosto, mostrava o entusiasmo que sentia em estar em Luanda e em contato com a nossa trienal. O ensaísta e curador, que também é docente universitário, diz que tem um especial interesse pela relação entre a arquitetura e a arte, a arte e o espaço.
“Pessoalmente tenho muito interesse na arquitectura, na espacialidade, nos campos activos no desenvolvimento das artes. Nos últimos anos, o espaço e o corpo são a grande matéria da arte” (http://forum.jokerartgallery.com/index.php?topic=335.msg647#msg647)
Nosso primeiro contato foi na casa do Fernando Alvim, numa noite regada a vinhos e conversas informais porém, bem construtivas, no sentido de troca de experiências entre as duas trienais e até mesmo sobre os projetos de colaboração para 2010. No dia seguinte no escritório, houve a apresentação formal e mais detalhada das duas trienais, com a participação de todos da FSD.
Nesse fim do dia, chegou em Luanda o João Luís Carrilho da Graça, arquiteto português de grande destaque e curador do projeto específico sobre Luanda para a 2ª Trienal de Arquitetura de Lisboa. Além de arquiteto, Carrilho da Graça dirige os departamentos de arquitetura de duas universidades em Portugal.
Encontrei uma ótima entrevista com ele de 2004 em que o entrevistador é o José Mateus e é sobre a casa que Carilho da Graça projetou de Julião Sarmento, artista português cujos trabalhos foram objeto de ensaios de autoria do Delfim Sardo.
Vale a pena visitar o site e conhecer os trabalhos daquele que é tido como o arquiteto referência de Lisboa pelo próprio José Mateus. Admirei em especial a Escola Alemã de Lisboa e a Escola Superior de Música de Lisboa. Muito interessante também o Centro de Controle Operacional de Brisa, com a sua fachada toda coberta de painéis solares.
Um doce de pessoa, João Luís Carrilho da Graça concedeu uma entevista para a revista “A Vida” do jornal angolano “O País” que resultuou numa ótima matéria sobre o projeto de colaboração entre as duas trienais, sua trajetória e sua visão sobre arquitetura.
Essas três grandes personalidades demonstraram enorme interesse pela Trienal de Luanda e pela cidade. Passamos um dia inteiro percorrendo a cidade de carro, visitando as arquiteturas e conhecendo melhor a cidade. Para mim, que só conhecia a baixa de Luanda, foi incrível também poder fazer esse tour logo no começo da minha estadia.
O entusiasmo de todos, das duas trienais, rendeu muitos frutos, de enorme valor. Valor humano, cultural, social e acima de tudo, afetivo. Esqueci de dizer que o conceito, ou melhor, a base da próxima Trienal de Luanda é “Geografias Emocionais – Arte e Afectos”. O que começou como um primeio encontro entre as duas trienais, acabou se tornando um grande laço de amizade e colaboração. Para mim, foi um enorme privilégio ter participado dessa conexão, que viria a ser a primeira de outras a seguir.
Acho que o que realmente me fascina nas viagens é, acima de tudo, penetrar nos diferentes mundos das tão diversas pessoas. É por isso que eu amo tanto viajar. Claro, as cidades, os lugares, os cheiros e as comidas também me hipnotizam, mas o que me comove tanto mais são as tão diferentes e fascinantes pessoas e seus universos.
Ainda vou falar mais sobre a Trienal de Luanda, mas por hoje, quis destacar essa primeira troca entre as duas cidades baseada no afeto que presenciei.